“El control apunta al lazo del analista con el lugar, es dicer que viene a verificar, en esta perspectiva, su grado de desubjetivacción en la experiência”.[1]
“A supervisão incide sobre o laço do analista com o lugar, isto é, ela verifica, nessa perspectiva, seu grau de subjetivação na experiência”.
Comentário: Ruth Helena Pinto Cohen
Ao analisarmos a frase de Miller, proposta para esse comentário, verificamos a condensação de muitos conceitos; o controle ou supervisão, se usarmos a tradução brasileira; o laço transferencial estabelecido entre paciente e analista; a destituição subjetiva, consequência do final de uma análise; e a transferência de trabalho, endereçada à Escola.
Duas linhas escritas, de uma lição proferida por Jacques-Alain Miller, no seminário “O lugar e o laço”, nos fazem mergulhar num mar de construções teóricas sobre a prática e a formação do psicanalista, com suas consequentes mutações transferenciais. Nessa estrutura discursiva, a supervisão se impõe como um dos processos que verifica o grau de desubjetivação na experiência analítica.
Mudando de lugar: um novo laço
Comecemos com a questão de como o exercício da supervisão acolhe alguém que deseja iniciar sua prática clínica e teórica, ou mesmo, aquele que chegou ao fim de um processo e, além do passe, se dirige a um outro analista. Sabemos que algumas análises chegam ao fim, mas não podemos dizer o mesmo da supervisão, já que o praticante estará sempre sendo interrogado pelos seus restos sintomáticos. Seguindo essa perspectiva, fica a questão sobre o estatuto do vínculo transferencial nas diferentes formas de enlace. Miller nos dá uma indicação preciosa quando fala do ponto da comparação entre controle e o dispositivo do passe. Ele lembra que o controle se faz sem a presença física do paciente e, no passe, sem o candidato[2]. O passe modelado na prática do controle tem no horizonte o analista (A.E), colocando-o à prova na Escola, lugar de garantia de sua formação.
Cabe aqui fazer uma pequena digressão sobre o uso dos significantes supervisão e controle. Rômulo Ferreira da Silva, em trabalho apresentado no Congresso de Membros, declara sobre o procedimento do passe: “o analista que indica o passador está em questão em última instância. É a situação do analista sob controle e não sob supervisão. O efeito da supervisão é claro e transmissível. O efeito do controle deixa em suspensão a indicação.”[3] Miller, por sua vez, conjuga as duas formas de abordar o tema, no texto “A Conclusão do Pipol V”[4], ao falar do desejo do analista: “o controle, a prática do que se chama supervisão serve para isso: para lavar as escórias remanescentes que interferem no tratamento” e, assim, proteger o paciente. A escolha do termo, portanto, não propõe uma disjunção, mas homologia quanto à função de verificar o “autorizar-se por si mesmo” de Lacan, na “Proposição de 67”, assim como no O Seminário, livro 21, ao complementar “com alguns outros.”[5] Estamos diante de um pressuposto ético da orientação lacaniana de um terceiro elemento, que no laço transferencial é “o lugar do Outro”. O supervisor pode se inscrever “na série dos terceiros, cuja autoridade o afirma de um ponto exterior ao que está em jogo entre o analisante, o analista e o inconsciente”[6]. Quando Lacan postula que a formação analítica não pode prescindir da supervisão, como um de seus eixos, é para limpar o terreno de um “confuso desejo de ser analista” e localizar a emergência do “desejo do analista”[7], que, se “não é puro”, busca obter a “diferença absoluta”[8].
De que transferência se trata na prática da supervisão?
Marie-Hélène Brousse sinaliza a necessidade da supervisão quando a “cegueira do analista que, preso na transferência, pode ter um ponto obscuro, resto de sua posição de gozo como sujeito, no manejo de seu ser na análise.”[9] Este comentário indica a função do supervisor, na posição de mediador entre analista e analisante, servindo de termômetro ao grau de desubjetivação, daquele que conduz o caso. Essa prática, sob transferência, pode localizar restos sintomáticos do analista que se alojam obstruindo sua função de semblante de objeto a, causa de desejo.
Seguindo a indicação de Miller, no “Banquete dos Analistas”, o controle/supervisão não tem valor se for limitado à relação do analista com seu paciente[10], deve ir além, ou seja, buscar verificar como aquele que ocupa o lugar de agente no discurso analítico opera com a psicanálise. Em outro momento dirá: “É preciso que haja também a parceira-psicanálise. É preciso jogar sua partida”[11].
Lacan, com a “Proposição de 1967”, isola a psicanálise da terapêutica, condição para que uma análise possa ter um fim. Se não há travessia da transferência, ou seja, se a análise pessoal – espinha dorsal da formação analítica – finaliza seu processo, culminando com a destituição do sujeito-suposto-saber na situação analítica, qual o destino do processo transferencial? Teríamos como orientação o redirecionamento à Escola, pelo viés da transferência de trabalho.
Uma formação pede mais, fazendo coro com Miller no seminário “O lugar e o laço”, quando pergunta: “O que a supervisão supervisiona?”. Poderíamos tentar abrir a questão colocando o desejo de saber do lado do analista, que indicaria, não mais o efeito sujeito, mas uma exigência ética, que implicaria responsabilizar-se por seu ato.
